quarta-feira, 29 de janeiro de 2014

Toda nudez será castigada




Prostituta e/ou santa? É a pergunta a ser feita em relação a personagem Geni da famosa peça "Toda Nudez Será Castigada", escrita por Nelson Rodrigues em 1965.

Já havia lido a peça e assistido ao filme homônimo feito por Arnaldo Jabor em 1973, mas confesso que a montagem da Cia. Arlecchino dirigida por Kalluh Araújo impressionou-me profundamente. As atuação brilhantes de Cléo Carmona (Geni) e Paulo Rezende (Patrício) dão um sabor especial ao espetáculo.

A peça mostra o drama de Herculano, um viúvo que, tendo prometido ao filho nunca mais se envolver com uma mulher após a morte da esposa, acaba se apaixonando pela prostituta Geni, graças as artimanhas de seu cínico irmão Patrício. O tom dramático da peça gira em torno do problema do sexo como força avassaladora capaz de destruir a ordem instaurada. Ao mesmo tempo, é também o que redime o ser humano. Geni, personagem que lembra muito a Sônia (prostituta de “Crime e Castigo” de Dostoiévski, livro que Nelson admirava muito), é aquela que arruína e redime o destino de todos os outros personagens: Herculano, As três tias (que, como Moiras, buscam tecer o destino dos sobrinhos) e o jovem Serginho. O único que passa aparentemente imune a qualquer transformação é o irmão de Herculano, Patrício, o niilista da peça, o personagem para o qual não existe salvação.

O cenário da peça merece uma atenção especial: três cilindros de metal que, quando girados, revelam cada um dos ambientes da peça. A trilha sonora vai da Ave Maria de Schubert a Waldick Soriano. Em um momento da peça as três tias cantam juntas “O Fortuna”, trecho de Carmina Burana de Carl Orff, o que fortalece a analogia com as mitológicas Moiras.

Em certo trecho de “Crime e Castigo”, Raskólnikov se ajoelha aos pés da prostituta Sônia e, ao ser indagado por ela acerca daquela ação, responde Raskólnikov: “Eu não me ajoelhei diante de ti, mas diante de toda a dor humana”. Impossível não recordar tal cena quando, ao fim da peça, Geni aparece crucificada, como um novo Cristo, “qui tollit peccata mundi”. A peça possui uma força rara de se ver no teatro brasileiro atual. Vale a pena assistir.

terça-feira, 21 de janeiro de 2014

Ninfomaníaca, ou o sexo como inferno




Assisti no último do domingo ao novo filme do diretor dinamarquês Lars von Trier, "Ninfomaníaca". Trata-se de um excelente filme. É um dos únicos dois filmes que conheço (o outro é "Shame", de Steve McQueen) que trata o sexo não como uma panaceia redentora e sim como o INFERNO que ele é.

No filme, Joe (personagem vivida por Charlotte Gainsbourg), uma ninfomaníaca que vive a consciência de sua tragédia, conta sua história para um velho que lhe oferece ajuda. Ela, mesmo de uma perspectiva "não-religiosa", insiste em considerar-se uma pecadora; uma pessoa má. Conta suas "aventuras": a amizade com pai; os amantes; as feridas que provocou. Sempre com a consciência do "vício" e da impossibilidade de lutar contra a vontade cega que lhe tirava qualquer possibilidade de controle. 

Impossível não relacionar a personagem principal do filme aos personagens esmagados pelo vício e pela culpa que aparecem nos romances de Dostoiévski. Impossível não lembrar de Marmeládov e seu alcoolismo suicida. 

Ao contrário do que pensam alguns progressistas, o sexo não liberta, mas sim escraviza e, no extremo, desumaniza. 


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