terça-feira, 31 de janeiro de 2012

La Traviata - Libiamo ne'lieti calici - Anna Netrebko & Rolando Villazon

Lindo trecho de "La Traviata", de Giuseppe Verdi:



Para fazer o download da música em MP3 clique aqui
Para baixar a ópera em formato DVD-R com legendas em inglês, português, espanhol e italiano, clique aqui e baixe o arquivo torrent

O Inferno Lírico de Badou Sarcass VII






Badous Sarcass: um mito infame.


Fonte de toda alegria e de toda dor...


Herdeiro do absurdo de nossa existência...

Jacob Burckahrdt: Profeta de Nossa Época



A GLÓRIA, já se disse, é o conjunto dos mal-entendidos que se criam em torno de um nome. Muitas vezes esses mal-entendidos formam um denso nevoeiro, donde surge um busto de gesso, o ídolodas Obras Completas, cobertas de poeira: é o caso dos "clássicos". Às vezes esses nevoeiros desaparecem, de súbito, para permitir uma ressurreição surpreendente: é o caso dos "poetas malditos". É muito raro que o véu se levante pouco a pouco, oferecendo o espetáculo de uma renovação incessante, toda a história de uma glória: é o caso de Jacob Burckhardt.
 
Os seus contemporâneos conheciam-no pouco. A posteridade imediata reconheceu o grande historiador da civilização, para depois enganar-se profundamente sobre as suas teorias. Para nós, no momento que atravessamos, tornou-se o conselheiro íntimo da nossa angústia. Amanhã será um profeta, o último dos profetas talvez, já que o tempo não terá mais futuro. Eis quatro etapas da história de uma glória. O caminho para a compreensão está traçado. A sua biografia é muito simples. Filho de uma velha família patrícia de Basiléia, nascido em 1818, consagra-se aos estudos mais diversos. Uma incursão no jornalismo político fracassa. De 1844 a 1893, ensina história das belas-artes na velha Universidade da sua cidade natal, pouco conhecido do público, mas muito estimado dos seus colegas. Burckhardt ama a sua cidade, as estreitas ruas medievais, os telhados e torres, observatório do grande mundo batalhador fuori le mura, a cidade íntima, pátria; só a abandona para viagens à Itália, país da sua nostalgia, nunca atenuada. Recusa cargos honrosos nas grandes universidades alemãs, traço de profunda significação que compreenderemos depois. Enfim, velho e fatigado, retira-se da atividade para morrer docemente num dia de agosto de 1897. Uma vida fora vivida.
 

segunda-feira, 30 de janeiro de 2012

O profeta Tocqueville




Traduzido por Felipe Melo, editor do blog da Juventude Conservadora da UNB.

O dom de prever em um século o formato político, econômico e social do século seguinte é dado com bastante frugalidade. Todavia, uma gritante exceção a essa regra é Alexis de Tocqueville [1], o cientista político francês liberal-conservador. Sua “Democracia na América”, publicada após uma longa viagem pelos Estados Unidos nos anos 1830, é importante tanto por sua visão presciente sobre alguns dos problemas futuros da América e do mundo ocidental quanto por seus afiados insights sobre a América tal qual era no tempo de Andrew Jackson [2].

Ele próprio um aristocrata, Tocqueville via na democracia uma tendência do futuro. Ele notou que o sol dos monarcas absolutos e das nobrezas privilegiadas estava se pondo. O prospecto do triunfo da democracia não lhe inspirava nem entusiasmo desqualificado, nem fanática repulsa. Pois a democracia, como ele a via, seria boa ou ruim na medida em que oferecesse salvaguardas necessárias à liberdade individual. Em um tempo quando a maior parte dos membros de sua classe se referiam à democracia como anarquia iminente e a queda de toda autoridade legítima, Tocqueville anteviu que o real perigo a ser antecipado por um governo democrático não era excesso de fraqueza, mas de força, capacidade de esmagar, dobrar ou enfraquecer a vontade de liberdade do indivíduo. Pertence a Alexis de Tocqueville o crédito, em uma era de monarquia hereditária e economia laissez-faire, de apreender a possibilidade do Estado totalitário e da sociedade de bem-estar. Era no colapso ou desaparecimento das formas tradicionais de autoridade sem a ascensão de sociedades livres solidamente alicerçadas que se encontram as principais causas do surgimento de Lenins e Stalins, Hitleres e Mussolinis. Eis a premonição de Tocqueville sobre esse perigo:

Em nossos dias, quando todas as posições são mais e mais confundidas, quando o indivíduo desaparece na multidão, e se perde facilmente em meio a uma obscuridade comum, quando a honra da monarquia quase perdeu seu império sem ser sucedida pela virtude pública, e quando nada permite ao homem ascender a si mesmo, quem poderá dizer a que ponto as exigências do poder e a servidão da fraqueza interromper-se-ão? [...]

Os anais da França não fornecem nada análogo à condição em que esse país pode ser lançado. Mas isso pode ser melhor assimilado aos tempos antigos, e àquelas hediondas eras de opressão romana, quando os costumes do povo foram corrompidos, suas tradições obliteradas, seus hábitos destruídos, suas opiniões estremecidas, e a liberdade, expulsa das leis, não pôde encontrar refúgio na terra; quando nada protegia os cidadãos e os cidadãos não mais se protegiam a si mesmos; quando a natureza humana era o esporte do homem, e príncipes exauriam a clemência dos Céus antes de esgotar a paciência de seus subalternos. [3]

A mulher, o bebê e o intelectual




Os comunistas mataram muito mais gente no século 20 do que o nazismo, o que é óbvio para qualquer pessoa minimamente alfabetizada em história contemporânea.

Disse isso recentemente num programa de televisão. Alguns telespectadores indignados (hoje em dia ficar indignado facilmente é quase índice de mau-caratismo) se revoltaram contra o que eu disse.

Claro, a maior parte dos intelectuais de esquerda mente sobre isso para continuar sua pregação evangélica (no mau sentido) e fazer a cabeça dos coitados dos alunos. Junto com eles, também estão os partidos políticos como os que se aproveitam, por exemplo, do caso Pinheirinho para "armar" a população.

O desespero da esquerda no Brasil se dá pelo fato de que, depois da melhoria econômica do país, fica ainda mais claro que as pessoas não gostam de vagabundos, ladrões e drogados travestidos de revolucionários. Bandido bom é bandido preso. A esquerda torce para o mundo dar errado e assim poder exercer seu terror de sempre.

Mas voltemos ao fato histórico sobre o qual os intelectuais de esquerda mentem: os comunistas (Stálin, Lênin, Trótski, Mao Tse-tung, Pol Pot e caterva) mataram mais do que Hitler e em nome das mesmas coisas que nossos intelectuais/políticos radicais de esquerda hoje pregam.

Caro leitor, peço licença para pedir a você que leia com atenção o trecho abaixo e depois explico o que é. Peço principalmente para as meninas que respirem fundo.

"(...) um novo interrogador, um que eu não tinha visto antes, descia a alameda das árvores segurando uma faca longa e afiada. Eu não conseguia ouvir suas palavras, mas ele falava com uma mulher grávida e ela respondia pra ele. O que aconteceu em seguida me dá náuseas só em pensar. (...): Ele tira as roupas dela, abre seu estômago, e arranca o bebê. Eu fugi, mas era impossível escapar do som de sua agonia, os gritos que lentamente deram lugar a gemidos e depois caíram no piedoso silêncio da morte. O assassino passou por mim calmamente segurando o feto pelo pescoço. Quando ele chegou à prisão, (...), amarrou um cordão ao redor do feto e o pendurou junto com outros, que estavam secos e negros e encolhidos."

Este trecho é citado pelo psiquiatra inglês Theodore Dalrymple em seu livro "Anything Goes - The Death of Honesty", Londres, Monday Books, 2011. Trata-se de um relato contido na coletânea organizada pelo "scholar" Paul Hollander, "From Gulag to the Killing Fields", que trata dos massacres cometidos pela esquerda na União Soviética, Leste Europeu, China, Vietnã, Camboja (este relato citado está na parte dedicada a este país), Cuba e Etiópia.

Dalrymple devia ser leitura obrigatória para todo mundo que tem um professor ou segue um guru de esquerda que fala como o mundo é mau e que devemos transformá-lo a todo custo. Ou que a sociedade devia ser "gerida" por filósofos e cientistas sociais.

Pol Pot, o assassino de esquerda e líder responsável por este interrogador descrito no trecho ao lado, estudou na França com filósofos e cientistas sociais (que fizeram sua cabeça) antes de fazer sua revolução, e provavelmente tinha como professor um desses intelectuais (do tipo Alain Badiou e Slavoj Zizek) que tomam vinho chique num ambiente burguês seguro, mas que falam para seus alunos e seguidores que devem "mudar o mundo".

De início, se mostram amantes da "democracia e da liberdade", mas logo, quando podem, revelam que sua democracia ("real", como dizem) não passa de matar quem não concorda com eles ou destruir toda oposição a sua utopia. O século 20 é a prova cabal deste fato.

Escondem isso dos jovens a fim de não ter que enfrentar sua ascendência histórica criminosa, como qualquer idiota nazista careca racista tem que enfrentar seu parentesco com Auschwitz.

Proponho uma "comissão da verdade" para todas as escolas e universidades (trata-se apenas de uma ironia de minha parte), onde se mente dizendo que Stálin foi um louco raro na horda de revolucionários da esquerda no século 20. Não, ele foi a regra.

Com a crise do euro e a Primavera Árabe, o "coro das utopias" está de volta.

domingo, 29 de janeiro de 2012

Havel, cebolas e cenouras

Confiram o excepcional artigo de Demétrio Magnoli*:

Fez ontem um mês que morreu Vaclav Havel. No dia seguinte ao enterro, 80 mil manifestantes reunidos em Moscou interromperam por um minuto o protesto contra Vladimir Putin para homenageá-lo em silêncio. Eles perceberam que o mundo ficou mais pobre sem Havel. O intelectual, dramaturgo e dissidente checo ensinou, ao longo de uma vida, que o contrário do comunismo não é o capitalismo, mas a verdade.

Havel não era um dramaturgo excepcional, nem um ensaísta genial. Contra o cenário fulgurante da vida literária, artística e filosófica da Europa Central, suas peças e seus textos parecem, com apenas uma exceção notável, experimentos secundários. "A obra mais importante de Havel é sua própria vida", disse o romancista Milan Kundera. E, no entanto, ele fez mais diferença que qualquer outro.
A dissidência comunista nasceu junto com a consolidação do poder bolchevique na Rússia. Antes de Hannah Arendt iluminar os paralelos entre o comunismo e o nazismo (Origens do Totalitarismo, 1951), figuras como Victor Serge (É meia-noite no século, 1939), Arthur Koestler (O Zero e o Infinito, 1940) e George Orwell (A Revolução dos Bichos, 1945) cortaram o corpo apodrecido do sistema soviético com o bisturi da literatura e escancararam a natureza do totalitarismo. Havel inspirou-se nesses predecessores para formular o seu diagnóstico: o mal manifestava-se como linguagem - e, justamente por isso, contaminava a sociedade inteira.

O Poder dos Sem-Poder, de 1978, é o grande voo ensaístico de Havel. Escrito logo após um encontro furtivo com o dissidente polonês Adam Michnik, o texto desvendou o segredo do poder comunista tardio. O terror stalinista, com seu cortejo indescritível de opressão e brutalidade, era coisa do passado. No lugar dele se instalara um sistema "pós-totalitário", expressão que não pretendia conotar a superação do totalitarismo, mas uma acomodação essencial das engrenagens de controle da sociedade. O fundamento do sistema residia na mentira ritualizada.

Por que o administrador da quitanda pendura na vitrine, junto com as cebolas e as cenouras, um cartaz com os dizeres "trabalhadores do mundo, uni-vos!"?, indagou Havel. Ele não estava "genuinamente entusiasmado com a ideia da unidade dos trabalhadores do mundo". O cartaz fora "enviado da sede da empresa ao verdureiro, junto com as cebolas e cenouras". O homem expunha-o porque "agia assim há anos", "todos fazem o mesmo" e "tais coisas devem ser feitas para que tudo corra bem na vida". O pós-totalitarismo comunista operava com base no hábito, na imitação, no medo e num interesse pessoal mesquinho. A doutrina que anunciara a libertação de toda a humanidade se conservava no poder pelo estímulo organizado das inclinações humanas à subserviência, à hipocrisia e à covardia. O poder comunista pereceria quando as pessoas sem poder simplesmente se recusassem a desempenhar os papéis deploráveis que lhes haviam sido designados.

Na superfície, não parece existir nenhum traço comum entre Havel e o polonês Leszek Kolakowski. O checo nunca foi comunista; o polonês ingressou no partido na juventude, destacando-se como brilhante promessa. Por motivos políticos, as portas da universidade fecharam-se ao checo; pelas mesmas razões, abriram-se de par em par ao polonês, que cursou filosofia e, em 1950, ganhou uma viagem à "pátria do socialismo". A visita teve consequências inesperadas, pois aquela fresta para a "desolação material e espiritual" da URSS quebrou sua fidelidade ideológica, convertendo-o em dissidente. Mesmo nessa condição, porém, um abismo o separava de Havel: o polonês entregou-se à crítica da filosofia marxista da História, transitando numa esfera teórica distante dos interesses intelectuais do checo.

Entretanto, um fio profundo une Kolakowski a Havel. De volta à Polônia, Kolakowski publicou um ensaio devastador que contestava o núcleo do pensamento marxista. A História não é previsível, escreveu, delineando um raciocínio que o conduziria à conclusão de que o stalinismo não representava uma aberração do comunismo, mas a sua plena realização. O dogma da previsibilidade da História é a fonte da noção de que os destinos da sociedade devem ser depositados no partido. Tal noção, por sua vez, esculpe a linguagem política da mentira, privando a sociedade de valores genuínos e esvaziando a vida pública de qualquer sentido cívico.

A Revolução de Veludo, de 1989, transferiu um relutante Havel dos bastidores do Teatro Lanterna Mágica para o Castelo de Praga. No cargo quase simbólico de presidente da Checoslováquia, ele convidou Frank Zappa para tocar no concerto "Adeus ao Exército Soviético", última performance pública do músico. Também evitou que a separação entre a República Checa e a Eslováquia degenerasse nos horrores do conflito étnico. Há três anos, como ato político derradeiro, Havel inspirou a Declaração de Praga, que classifica o comunismo, ao lado do nazismo, como causa dos mais terríveis crimes do século 20. O documento solicita que o 23 de agosto, data da assinatura do Pacto Molotov-Ribbentrop, seja transformado em dia de memória das vítimas dos dois totalitarismos paralelos.

Dias atrás, a blogueira cubana Yoani Sánchez divulgou um apelo em vídeo à presidente Dilma Rousseff. Yoani foi convidada para a estreia do documentário Conexão Cuba-Honduras, do cineasta Dado Galvão, na Bahia, em fevereiro, mas o governo cubano continua a negar-lhe uma autorização de viagem. Ela não pode viajar porque, como ensinou Havel, escolheu "viver na verdade", recusando-se a seguir o roteiro escrito pelo pós-totalitarismo. Todos nós podemos erguer um brinde em memória do dissidente checo. Dilma tem a oportunidade de homenageá-lo com um gesto especial: intercedendo em favor de Yoani. Nossa presidente fará uso desse privilégio ou preferirá celebrar uma mentira emoldurada por cebolas e cenouras?

*SOCIÓLOGO, DOUTOR EM GEOGRAFIA HUMANA PELA USP

O Inferno Lírico de Badou Sarcass VI






Maio... mês que não passa, mês que tortura minh'alma, início de um inverno que não sinto e que não é capaz de me fazer sofrer. Não a mim. Não Badou Sarcass, alguém que não existe há muito. As noites estão mais frias, chegam mais cedo e trazem aquela dor, humana, que eu amo desde que nasci. Badou Sarcass, o maior dos vermes, supra-sumo do submundo, angustiado em seu Inferno Lírico, acima de tudo um lúcido. Nestas frágeis linhas escritas por uma mão trêmula que segura um cigarro mas não tem coragem de acendê-lo, deixo marcado meu olhar sobre o frágil outono brasileiro, este, como Badou, também uma inexistência que insiste em persistir.

Rita Lee entra em surto, é detida e liberada. Chamem a Maria do Rosário, o Gilberto Carvalho, a Dilma Rousseff, o Paulo Teixeira…







Leiam o que informa Marcus Preto, na Folha Online. Volto depois:
 

A cantora Rita Lee, 67, foi liberada após prestar depoimento e assinar um boletim de ocorrência numa delegacia de Aracaju (SE). Ela foi detida por policiais ao fim do último show de sua carreira, no Festival Verão Sergipe. Ao avistar policiais na plateia, a cantora declarou que não os queria em sua apresentação. “Vocês são legais, vão lá fumar um baseadinho.” O imbróglio começou no meio do show, quando a cantora afirmou ter visto membros de seu fã clube, que viaja trás dela pelo Brasil, sendo agredidos pelos policiais. Tendo se aproximado do palco, os policiais foram xingados pela cantora de “cavalo”, “cachorro”e “filho da puta”. “Sobe aqui”, dizia Rita a eles, desafiando-os. Ela fez o show até o final, quando foi levada à delegacia.

O boletim de ocorrência foi tipificado como “desacato e apologia ao crime ou ao criminoso (art. 287 do Código Penal)”. “A sensatez falou mais alto no momento, por isso a polícia não parou o show”, disse o tenente-coronel Adolfo Menezes, responsável pelo policiamento do show. A ex-senadora e hoje vereadora de Alagoas Heloisa Helena (PSOL) chegou à delegacia antes de Rita e para assinar o B.O. como testemunha a favor do caso. No mesmo boletim Rita disse que” não tem nata a relatar a cerca dos fatos no noticiário, justificando apenas que todo o ocorrido se deu como uma reação emocional, provocada pela ação truculenta desnecessária”.

O governador Marcelo Déda (PT), que assistiu à apresentação, disse ter testemunhado “um espetáculo deprimente” por parte de Rita. “A polícia não tinha feito nenhum tipo de ação que justificasse [a atitude da cantora]“, declarou Déda. Para o governador, a cantora tentou colocar o público, estimado em 20 mil pessoas pela organização, contra os policiais, o que poderia levar a uma “confusão generalizada”, segundo ele.

No Twitter, Beto Lee, filho de Rita, protestou: “A policia de Aracaju levou minha velha para a delegacia. Bando de frouxo”. A própria cantora tuitava ao lado dos policiais: “Tô indo p/ a delegacia…a polícia d Aju ñ gosta d mim mas Sergipe gosta, estou dentro do carro, eles estaaoentravv [sic]“. Pelo microblog, o cantor Lobão também se manifestou: “Mas era soh o que faltava…prender a Ritinha eh de última!”.


Voltei
 

O que eu tenho a dizer? Ou o remédio da Rita Lee acabou ou que ela precisa trocar de substância. Tem todo jeito de ser um surto. Imaginem se milhares de, sei lá, 5% de uma platéia estimada em 20 mil pessoas decidissem partir pra cima de policiais, pais de família que estão lá fazendo o seu trabalho. Poderia acontecer uma tragédia.

O Beto Lee acha que a polícia é composta por um “bando de frouxos”. Que vá lá pessoalmente e repita os impropérios da mãe, cara a cara, a policiais, para mostrar como age um não-frouxo. Lobão acha “de última”? Por quê? Ele já demonstrou várias vezes ser contra a impunidade dos políticos. Eu também sou. É, no entanto, a favor da impunidade e da irresponsabilidade dos artistas??? Talvez se possa dizer em favor de Rita Lee que não está em seu juízo perfeito. Bem, então seu lugar não é o palco.

Eu estou com 50 já. Acho que a única vantagem de ir envelhecendo é ganhar alguma sabedoria. Rita Lee está recusando esta também. Está na hora de começar a ouvir, sei lá, Bach talvez. Tomando leite com chocolate. Tenham paciência!


Agora outro aspecto
 

Imaginem um roqueiro velho, já gozando da condição de inimputável, sendo preso pela POLÍCIA DE SÃO PAULO por rigorosamente estes mesmos motivos. Aquela gente de sempre, aliada de Déda, sairia dizendo que o governo de São Paulo militarizou a USP, a cracolândia, o Pinheirinho e o rock!!!
Eduardo Suplicy, com a agilidade costumeira, correria à delegacia para cantar um rap dos Racionais… Paulo Teixeira emitiria um manifesto em parceria com a turma do Desentorpecendo a Razão… Aquela canalha a soldo do governo federal e das estatais, que se finge de jornalista, gritaria “censura”! Os vigaristas que dão plantão nas redes sociais fariam um escarcéu dos diabos.

Mas, sabem como é, foi a “polícia do PT”. Se um estudante que ficou cego de um olho num protesto no Piauí não comove o coração dessa gente, é provável que a detenção de Rita Lee também não mobilize ninguém.


E deixo claro…
 

Tendo tudo acontecido como se relatou acima, tinha de ser presa mesmo! A PM de Sergipe está certa! Eu sou contra a impunidade para políticos, para petistas, para artistas, para ricos, para pobres, para brancos, para pretos, para homens, para mulheres, para héteros, para gays, para leigos, para padres, para pastores,  para católicos, para evangélicos, para onívoros, para vegetarianos… Só livro a cara das crianças e dos idiotas clínicos. E, ainda assim, acho que as crianças precisam ser educadas, e os idiotas clínicos, tratados.

Ah, sim, Lobão: perguntaram a De Gaulle por que ele não mandava prender Jean-Paul Sartre, que fazia agitação maoísta no pré-maio de 1968 —  não chegava a chamar a polícia de “filha da puta” ou a incentivar o linchamento de policiais. “Não se pode prender Voltaire”, teria dito o presidente.
Entendi, Lobão. Rita Lee é nosso Voltaire!

segunda-feira, 23 de janeiro de 2012

Michael Oakeshott e a disposição conservadora









Michael Oakeshott (1901-1990) é um dos pensadores políticos mais originais do século 20. Sendo conservador, no sentido britânico, apresenta-se como céptico. E acusa os chamados "progressistas" de serem defensores de uma política de fé. No mundo moderno, sustentou Oakeshott, a principal expressão da política de fé é o "racionalismo em política".

Política de perfeição. O racionalista, argumenta Oakeshott, "always stands", quer dizer, é sempre a favor de alguma coisa ou contra alguma coisa. As circunstâncias do mundo moderno fazem do racionalista um ser eminentemente contencioso: "Ele é o inimigo da autoridade, do preconceito, do simplesmente tradicional, costumeiro ou habitual."

Ele acredita que a sua Razão (com R maiúsculo) sabe sempre melhor o que é melhor para si e para os outros. Dizendo-se crítico da fé (sobretudo religiosa), ele é afinal o mais ardente defensor da fé em política.

Para o racionalista, existe sempre uma solução racional para todo e qualquer problema. O racionalista não conhece "o melhor dadas as circunstâncias": ele só conhece "o melhor". Para cada problema, a Razão só pode encontrar uma resposta: a resposta Racional. O melhor sistema de ensino, por exemplo, não pode variar de acordo com circunstâncias regionais, muito menos locais, ou com diferentes aspirações de diferentes pessoas, ou pela coexistência concorrencial entre diferentes soluções. O melhor sistema de ensino é só um e será dado pela Razão. O mesmo com o sistema de saúde pública ou com outro problema qualquer.

Para cada problema, haverá uma solução: a solução racional, a melhor. A isto chama Oakeshott política de perfeição.

Política de uniformização. Da política de perfeição decorre naturalmente uma política de uniformização. Se eu estou seguro de que existe uma e uma só solução racional, é perfeitamente compreensível que eu queira generalizá-la uniformemente. Posso admitir compromissos, mas o meu objectivo não pode deixar de ser a generalização uniforme da melhor solução determinada pela Razão. Por isso, eu terei uma atitude de fundo de intolerância para com todos os desvios, ou resistências, à solução racional. Como poderia ser de outra forma, se a solução racional é a melhor solução e se eu não conheço o conceito de "melhor dadas as circunstâncias?

Hostilidade à liberdade. Daqui decorre inevitavelmente uma política de hostilidade para com os modos de vida descentralizados - e, por isso, variados - que emergem de uma atmosfera de liberdade. Estes modos de vida descentralizados não foram obviamente desenhados pela Razão: eles simplesmente existem, estão lá, pela simples razão de que já existiam e de que alguém os achou suficientemente confortáveis para continuar a praticá-los - ou a usufruir deles.

Por isso, segundo Oakeshott, as consequências políticas desta atitude intelectual do racionalista são facilmente observáveis no mundo moderno: a uniformização, a centralização, a intolerância e a hostilidade contra todos os modos de vida descentralizados - e, por isso mesmo, variados - que naturalmente emergem de uma atmosfera de liberdade. A derradeira e mais duradoura consequência política do racionalismo vai ser a hostilidade à liberdade - embora o racionalista vá atacar a liberdade em nome da liberdade.

Disposição conservadora. Contrariamente ao racionalismo moderno, o conservador (de tipo britânico) terá um compromisso fundamental com a liberdade. Mas, diferentemente do liberalismo e do socialismo, esta defesa da liberdade não vai decorrer de uma doutrina ou de um sistema deduzidos a partir de premissas abstractas primeiras - como seria o caso da liberdade, no liberalismo, ou da igualdade, no socialismo.

A disposição conservadora nasce de um attachment e de uma disposição para usufruir aquilo que nos é familiar. E esse attachment não resulta da convicção de que o que nos é familiar é necessariamente "o melhor". Antes de mais, o nosso modo de vida é o nosso, aquele em que nos sentimos confortáveis, e que gostamos de usufruir, basicamente porque nos é familiar.

Risco de perda. Esta disposição para usufruir gera naturalmente, imperceptivelmente, um sentimento de risco de perda. Se apreciamos o que temos e o que fazemos, numa palavra, se apreciamos o nosso modo de vida, é natural que decorra daí uma certa relutância relativamente a propostas de mudança radical. O risco de perda daquilo que apreciamos - e que conhecemos, que nos é familiar - estará sempre inerente a mudanças cujos resultados não podemos conhecer inteiramente, dado que elas ainda não tiveram lugar. Daí que Oakeshott diga: "Ser conservador, portanto, é preferir o familiar ao desconhecido, preferir o experimentado ao não experimentado, o facto ao mistério, o real ao possível, o limitado ao ilimitado, o próximo ao distante, o suficiente ao demasiado abundante, o conveniente ao perfeito, um presente sorridente a uma felicidade utópica."

Política como ordem superficial. Para este conservador, o primeiro requisito de um regime político será a protecção da sua casa, isto é do seu modo de vida. Ele não pede ao regime político que lhe diga como deve ser a sua casa, apenas que a proteja. Em contrapartida, também não quer dizer ao vizinho como deve ser a casa dele. Não espera, portanto, que o regime político o faça. Por outras palavras, o conservador oakeshottiano nunca verá a acção política como sede de uma actividade cujo propósito pudesse ser desenhar os modos de vida das pessoas. 

Ele também não pode ver a ordem política como uma ordem que abarca, ou deva abarcar, toda a vida social. Ele tenderá a ver a ordem política como um "ordem superficial", cuja função primeira deverá ser a garantia de que os modos de vida podem ser vividos ou usufruídos com paz e tranquilidade.

Por outras palavras, o conservador Oakeshottiano pedirá ao governo, antes de mais, que garanta a liberdade de usufruto dos modos de vida variados que existem independentemente do governo ou de quem o ocupa.

Difusão do poder.A liberdade, para o conservador Oakeshottiano, consiste nesta possibilidade de usufruir de modos de vida descentralizados. Não se trata de uma liberdade abstracta, mas de uma liberdade que emergiu no Ocidente ao longo dos séculos, através de múltiplos arranjos particulares: limitação do poder político, liberdade religiosa, propriedade privada, garantias legais do indivíduo, etc.

Mas o mais importante é o que todos e cada um desses arranjos significa e representa: "A ausência na nossa sociedade de uma concentração de poder esmagadora." Vale a pena voltar a ouvir Oakeshott:
"Esta é a condição mais geral da nossa liberdade, tão geral que todas as outras condições podem ser vistas como estando compreendidas dentro dela. Ela aparece, em primeiro lugar, numa difusão de autoridade entre passado, presente e futuro. A nossa sociedade não é governada exclusivamente por nenhuma destas. [...] Além do mais, connosco o poder está disperso entre toda a multitude de interesses e organizações de interesses que compõem a nossa sociedade. Nós não tememos ou tentamos suprimir a diversidade de interesses, mas consideramos a nossa liberdade imperfeita enquanto a dispersão de poder entre eles for incompleta, e ameaçada se o interesse de alguém ou uma combinação de interesses, mesmo que possa ser o interesse de uma maioria, adquirir um poder extraordinário. De modo semelhante, a conduta do governo na nossa sociedade envolve uma partilha de poder, não só entre os órgãos do governo reconhecidos, mas também entre a administração e a oposição. Em resumo, nós consideramo-nos livres porque a ninguém na nossa sociedade é permitido um poder ilimitado - nenhum líder, facção, partido ou classe, nenhuma maioria, nenhum governo, igreja, corporação, associação profissional ou de comércio ou sindicato."

Estado de direito. Oakeshott sublinha que o método de governo mais apropriado a uma sociedade fundada na difusão do poder é "governo através de estado de direito", o qual define como "governo através do cumprimento, por métodos prescritos, de normas estipuladas que vinculam tanto os governos como os governados".

Uma sociedade regida pela rule of law é uma associação civil (civil association), a qual deve ser distinguida de uma associação empresarial (enterprise association). A principal diferença entre elas reside na questão da existência ou não de um propósito singular unificador (single unifying purpose).
A associação empresarial, como o nome indica, assenta num propósito unificador, num empreendimento comum, que gera a voluntária reunião dos seus membros para tentar alcançá-lo ou prossegui-lo. É um tipo de associação totalmente adequada para o sector privado, ou voluntário, ou para o que costumamos designar por sociedade civil. Mas é totalmente desadequado para a ordem política. Esta, como vimos, é uma "ordem superficial", que não deve procurar impor um "propósito singular unificador" na variedade e complexidade de propósitos e interesses de modos de vida variados.

A função desta "ordem superficial", numa associação civil, consiste fundamentalmente em proteger esses modos de vida e, para tanto, terá certamente de regulá-los externamente. Isto significa, sobretudo, delimitar as áreas e os procedimentos pacíficos em que cada um deles poderá ser usufruído sem prejudicar a paz civil e o recíproco usufruto dos outros. Significativamente, Friedrich A. Hayek considerou esta distinção de Oakeshott entre associação empresarial e associação civil muito semelhante à sua própria famosa distinção entre organização e ordem espontânea.

*Director do Instituto de Estudos Políticos da Universidade Católica Portuguesa, presidente da Churchill Society de Portugal

quarta-feira, 18 de janeiro de 2012

Epistemologia Agônica e Disfuncionalidade Humana: um ensaio de teologia pessimista



"Não há hoje praticamente ninguém que não esteja possuído da intenção pueril de ganhar a simpatia de um público. É a atitude que tomam as crianças por traumatismo da sua debilidade. O escritor quer agradar, o político precisa de agradar, o metafísico aspira a agradar. Essa subserviência que se instala numa fraude de desafecção, de impune demagogia, acaba por institucionalizar-se na pura superficialidade. E marca a agonia de uma cultura. A graça, contrário da exibição, alma sincera que persuade, desaparece. A civilização torna-se um método unicamente concebido para sobreviver.

Ao mesmo tempo que se nivela a inteligência – coisa que não se reparte senão fazendo-a produzir de maneira ilimitada – faz-se da timidez uma esperança. A cultura tornou-se matreira e o espírito, em vez de vigilante, fez-se opinioso."(1)

Meu objetivo neste paper é introduzir uma reflexão acerca do valor crítico que tem a atividade de investigação do fenômeno religioso. Poucos objetos de pesquisa são vítimas de tanta distorção quanto a religião. Penso que tal fato descreve na realidade um problema de concepção de mundo: a cosmovisão religiosa – ainda que dito de forma muito abrangente – parece entrar em frontal choque com aquela que define o advento da "modernidade". Não vou entrar nos meandros dessa discussão pois esta é já "quase" senso comum: a orfandade do ser humano moderno descreve sua solidão cósmica assim como sua (festejada) liberdade pós-adâmica. Com a mecânica moderna, passamos de um mundo como livro que revela seu autor a espaços infinitos de escuridão e silêncio, presos na matemática indiferente do átomo. O procedimento usual nesta "modernidade" é a redução do fenômeno religioso a alguma de suas mediações, psicológicas ou sociais.

terça-feira, 17 de janeiro de 2012

O Inferno Lírico de Badou Sarcass V




Retorno a mim mesmo após penosa viagem.

Conheci os homens e suas teorias, psiquiatrias, idolatrias.

Agora encontro conforto em minha doce embriaguez lúcida.

Estar só...  é como tocar o veludo.

Pensar por si mesmo é ser um louco, é não pensar...

Eu penso por todos, penso por Deus.

Minha entrega é total.

Naquelas vidas há muito perdidas eu vi algo de novo,

Não eram apenas passado, eram também porvir.

Mas foi essa visão, essa visão, Deus meu!

Perdeu-me para sempre....

Tornei-me insano.

Um Punhado de Pó

 

 

por Luiz Felipe Pondé

Pois quem pode saber o que é bom para o homem na vida, durante
os dias de sua vã existência, que ele atravessa como uma sombra?

Eclesiastes 6,12

Abertura

 O Eclesiastes deixa claro que o Deus de Israel não gosta de covardes.

Ao dizer isso, não pretendo erigir-me em especialista em Bíblia, no sentido de alguém que busque a todo o custo a literalidade histórica dos textos ou queira fazer a arqueologia de cada palavra; também não o sou no sentido de alguém que aplique cada versículo às incongruências da vida a título de operação salvífica; nem pretendo falar aqui a partir de alguma “burocracia da objetividade”.

Quem sou, então? Penso encontrar-me na mesma posição do comum dos mortais que procuram um sentido pessoal na leitura das Escrituras, e que eventualmente chegam à conclusão de não passarem daquilo que em inglês se chama suffering jokers - talvez um daqueles fools, os bobos da corte ou “loucos” que, mascarados sob o absurdo do que falam, às vezes têm mais a dizer sobre o real do que alguns pretensos sábios.

Quando me pergunto quem escreveu o Eclesiastes – para além de a resposta concreta já ter variado desde Salomão ou alguém de sua elite até qualquer membro de qualquer elite na Palestina ou fora dela por volta do século III a.C. -, assumo que foi Deus. Não o faço por razões confessionais (uma das vantagens da conversão a Atenas é a liberdade de espírito perante qualquer ortodoxia), mas antes de tudo pelo “efeito filosófico” da idéia de Deus, que me permite ver no texto uma mensagem dAquele que tudo sabe e tudo pode. Nessa mensagem descubro então uma análise precisa da condição humana que, além do mais, é capaz de despertar uma emoção profunda, uma emoção que o Antigo Testamento sempre descreve como oriunda das entranhas do homem.

A Vaca Premiada




Não há ser mais pungente e, repito, não há ser mais plangente do que o brasileiro premiado. O inglês, não, nem o francês. Um ou outro recebe qualquer prêmio com modéstia e tédio. Quando deram a Churchill o Nobel de literatura, ele nem foi lá. Mandou a mulher e continuou em Londres, tomando o seu uísque e mamando o seu charuto. O francês ou o alemão também reagiria com o mesmo superior descaro.

E que faria o brasileiro? Sim, o brasileiro que, de repente, recebesse um telegrama assim: “Ganhaste o prêmio Nobel. Gustavo da Suécia”. Pergunto se algum brasileiro, vivo ou morto, teria a suprema desfaçatez de mandar um representante, como fez o Churchill? Por exemplo: — o meu amigo Otto Lara Resende. Se a Academia Sueca, por unanimidade ou sem unanimidade, por simples maioria, o preferisse.

Semelhante hipótese, que arrisquei ao acaso, já me fascina. O Otto, prêmio Nobel. Que faria ele? Ou que faria o Jorge Amado? Ou o Érico Veríssimo? Eis o que eu queria dizer: — qualquer um de nós iria, a nado, buscar o cheque e a medalha. Nem se pense que faríamos tal esforço natatório por imodéstia. Pelo contrário. Nenhuma imodéstia e só humildade.

A nossa modéstia começa nas vacas. Quando era garoto, fui, certa vez, a uma exposição de gado. E o júri, depois de não sei quantas dúvidas atrozes, chegou a uma conclusão. Vi, transido, quando colocaram no pescoço da vaca a fitinha e a medalha. Claro que a criança tem uma desvairada imaginação óptica. Há coisas que só a criança enxerga. Mas quis-me parecer que o animal teve uma euforia pânica e pingou várias lágrimas da gratidão brasileira e selvagem.

O Big Brother, o estupro e as salsichas com alho







Sempre que alguém começa com esse negócio de que o Big Brother é irresistível e que todo mundo dá uma “espiadinha”, inventando um pretexto qualquer, ocorre-me a boutade de Karl Marx (sim, o dos furúnculos no traseiro), que era um excelente frasista, ao definir Luís Bonaparte, o sobrinho que seria a farsa do tio (ao menos na sua leitura), no “18 Brumário”: “Na sua qualidade de fatalista, ele [Luís Bonaparte] vivia e vive ainda imbuído da convicção de que existem certas forças superiores às quais o homem, e especialmente o soldado, não pode resistir. Entre essas forças estão, antes e acima de tudo, os charutos e o champanhe, as fatias de peru e as salsichas feitas com alho”. Pois é… Há quem realmente e de fato não assista ao Big Brother - assim como deveria haver soldados que detestassem salsicha com alho. Mas o caso grita, não é?, está em toda parte, ocupa as redes sociais. Impossível ignorar.

Aqui e ali, fiquei sabendo, como todo mundo, que esta edição do programa estaria mais, deixem-me procurar as palavras, “sensualizada”, com as peladas e os pelados atirados como nunca. Então tá! Um dos participantes, já expulso do programa, foi acusado de ter feito sexo não consensual, ou quase isso, com uma de suas colegas. Bêbada, a moça estaria sem condições de dizer “não” caso fosse essa a sua vontade. Bem, poupem-me dessa hora. Não vi e não verei. Já escrevi aqui sobre a mais recente redação da “lei do estupro”. Eu a considero conceitualmente falha. Se um caso, ainda que agressivo, de assédio já caracteriza um estupro, parece-me que o estupro propriamente dito perde um tanto de sua gravidade, o que é lamentável. Mas sigamos. A gritaria nas redes sociais contra o suposto estupro no Big Brother tem seu lado positivo. Acho bom e civilizado que não se dê de barato que a bêbada, afinal, escolheu o risco. Pode ter escolhido outros, não o de fazer sexo sem a sua explícita permissão. É evidente que o programa tentou ignorar os protestos, mas sentiu cheiro de carne queimada e teve de ceder. Quem faz um “Big Brother” que requer a participação de milhões tem de saber que pode acabar um dia no paredão. Foi o que aconteceu.

Realities shows são espetáculos deprimentes, seja o Big Brother, da Globo, a sua versão com alfafa, da Record, ou a da Band, com champanhe, besteirol e “mulheres ricas”. Nas férias, vi um troço inacreditável na televisão americana: um concurso de… cupcakes!!! As doceiras se matavam para cumprir as tarefas, diante de juízes muito rígidos, que faziam digressões sobre a “generosidade” do açúcar ou a “agressividade” da essência de amêndoas. Era de fazer inveja aos enólogos quando dissertam sobre o “caráter” e a “austeridade” dos vinhos - porque também os há “alegres” e “diletantes”. Entendo… Fiquei tão perplexo que uma das minhas filhas comentou, rindo: “Pai, você deixou cair o queixo…” O mundo, às vezes, é mau.

segunda-feira, 2 de janeiro de 2012

Feliz Ano-Novo, Kafka



Um artigo de Luiz Felipe Pondé

Para baixar o conto de Franz Kafka "A Construção" clique aqui


Acho o Réveillon uma festa chatíssima. Quando você estiver lendo esta coluna, estarei em Tel Aviv, e ainda bem que aqui não tem Réveillon.

A cidade é patrimônio cultural universal porque tem o maior conjunto arquitetônico Bauhaus do mundo, o que dá a ela um tom entre o blasé (isto é, a soma do cinza e branco típico dos prédios Bauhaus de poucos andares com o desleixo chique característico da população local mediterrânea) e o moderno da primeira modernização, antes de a modernidade virar essa coisa brega de massa.

Tel Aviv é descrita pelos israelenses como sendo "outro mundo", diferente do resto do país, justamente por seu caráter secular, arredio ao fanatismo religioso que cresce por aqui e aberto à convivência mundana.

Diante desse cenário, sempre que estou nesta cidade, meu pessimismo (que tem sua origem provavelmente em alguma forma de disfunção fisiológica) cede. O desleixo e o ar mediterrâneo, associados ao desespero mudo, embutido no cotidiano de quem se sabe uma espécie caçada, me acalmam. Estranho? Sou estranho mesmo.

Segundo reza uma das lendas sobre Franz Kafka, quando perguntaram a ele se não havia esperanças para o mundo, ele teria respondido: "Esperanças há muitas, mas não para nós".

De todas as formas de pessimismo, a de Kafka é a única que me assusta. Não temo pessimismos cosmológicos. Não espero nada da vida na forma de recompensa moral (aquilo que a teologia cristã chama "retribuição pelos méritos").

Antes de tudo porque não sou uma pessoa boa. Raramente me preocupo com os outros, e a África pouco me importa. Nem a fome. Nem as baleias. Nem você.

Não conto com a misericórdia de Deus porque não a mereço. Guerras sempre existirão, e a humanidade faz o que pode para sobreviver ao mundo e a si mesma.

A possível falta de sentido da vida não me interessa. Durmo bem com ela. Sou daqueles que pensam que a metafísica é fruto de indisposição e mau humor. Mas temo o pessimismo kafkiano como nada mais no mundo. Temo a burocracia. Todo amante da burocracia tem cara de rato. Kafka tinha razão.

O pior mundo de Kafka não é sua barata, mas aquele do seu conto "A Construção". O roedor que faz a "construção" em sua casa é a melhor descrição do inferno burocrático em que o mundo se transformou.

Kafka, à diferença da maioria de nossos especialistas em ciências humanas, sabe que construímos a burocracia para nos sentir seguros, e não porque nos obrigam a isso. E o pior é que existem muitas razões para nos sentirmos inseguros, por isso não há saída para o inferno que é a burocracia.

Algumas almas menos brilhantes assumem que um mundo "paperless" (nada mais ridículo do que usar expressões em inglês para se sentir mais científico), ou seja, sem papel, seria menos burocrático. Risadas... Nada mais horroroso do que alguns restaurantes que começam a trocar seus menus "físicos" por iPads. Logo nos farão escolher nossos pratos via rede, e eles acharão isso o máximo.

Um mundo "paperless" afogar-se-á em senhas. Você precisará de uma senha especial para usar sua senha menos especial e assim sucessivamente, ao infinito. Depois, precisará de um programa superavançado para ter acesso a todas as suas senhas e combiná-las de modo secreto (em si, uma outra senha).

Quando você tiver uma crise diante de tudo isso, algum burocrata dirá para você que isso tudo é para sua segurança. E você será obrigado a concordar, assumindo também uma cara de rato.

Mas, dirão as almas menos brilhantes, graças a Deus estamos cortando menos árvores e não estamos gerando papel.
No conto de Kafka "A Construção", nosso roedor atarefado teme um ruído horroroso que vem não sabe de onde e por isso começa a construir "rotas de fuga" em sua moradia subterrânea.

Logo, a rede de "rotas de fuga" é tão grande que ele se esquece onde começou e descobre que, apesar de o ruído aumentar cada vez mais e sua sensação de perigo aumentar junto com o ruído, ele já não sabe como fugir, porque suas rotas de fuga viraram um labirinto infernal.
O mundo de Kafka é uma prisão a céu aberto, e os ratos venceram. Feliz Ano-Novo.



O Inferno Lírico de Badou Sarcass IV



Gla glum glish glein Scarss

I]Um clish glum grer gra

Lish buh suh gloin!

Essa angústia louca
A ti nada expressa,
A mim diz tudo.

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